A Catraca Mole

Coletivos deteriorados são comuns em qualquer parte do país. E seu estado de manutenção é uma ótima justificativa para gritar aos quatro ventos como a qualidade do transporte não muda e a passagem aumenta a cada ano.

Certa vez durante uma viagem comum de volta para casa às 17h, três elementos dentro do velho coletivo se combinaram:

  1. A clara situação de ajuda humanitária em que o automóvel se encontra durante o horário de volta para casa (17h, 18h). Quatro pessoas ocupando um metro quadrado e ainda sim o zeloso condutor parando em todo ponto para mais cidadãos entrarem.

  2. Motorista extremamente estressado, com desejo de matança a qualquer alma viva que passa perto de si. Porém este não comete crime algum pois prefere manter o emprego, o que não o impede de descontar toda a raiva acumulada no acelerador e nas manobras, com arrancadas brutais e movimentos suspeitos no trânsito.

  3. Uma catraca mole. Já viu uma dessas? São aquelas em que o trocador tem que ficar segurando com o pé senão ela começa a rodar sozinha. Parece que não recebe manutenção há uns 20 anos ou veio assim de fábrica mesmo. É evidente que o agente de bordo segura a coisa pra ela não sair contando e descontando pessoas fantasmas que passaram por ela, caso contrário o pescoço dele estará em jogo na companhia.

Somados estes três fatores, o evento observado acontece quando uma senhora comum, voltando de um dia comum de trabalho, sobe no balaio. Esta, já notando que o condutor do veículo está soltando espuma pela boca, se previne e segura firme onde pode para se manter em pé logo na porta do coletivo, já que é fisicamente impossível prosseguir para além do mínimo e espremido espaço o qual ela ocupa naquele ônibus.

Com o passar do tempo, a delicada dama, de alguma maneira inexplicável, consegue chegar de forma segura da porta do ônibus até a catraca mole, porém a combinação fatal de dois efeitos acontece: Ela solta as mãos e as deixa ao ar livre para abrir sua bolsa e achar o cartão BHBus + O motorista vê uma brecha no trânsito a qual iria adiantar seu trajeto em incríveis 2 segundos, bastava manobrar para dentro da outra faixa rapidamente.

Pessoalmente eu nunca vi uma pessoa voar, mas acho que hoje observei a experiência mais próxima disso até hoje na minha vida. O amigo condutor pisando fundo no acelerador pra ver se seu veículo consegue se teletransportar pelo alto emprego de força no motor faz com que a inocente senhora receba seus votos de “teletransportidade” e suma da vista do trocador em questão de milésimos de segundos parando no chão mais ao centro do coletivo com mais 4 ou 5 pessoas afetadas pelo golpe involuntário. Esta passou pela catraca mole contabilizando, creio eu, umas 4 ou 5 rodadas completas.

Desespero pra lá, xingamentos pra cá e hematomas contados, eu tive que descer poucos minutos depois pois era meu ponto. Fiquei curioso pra saber quem iria pagar/reportar/abortar as passagens fantasmas que foram contabilizadas no ônibus. Tem como descontabilizar rodando essas catracas loucas ao contrário?